A palavra purgatório não é mencionada na Bíblia, da mesma forma que
termos como ‘encarnação’, ‘Santíssima Trindade’ ou até mesmo a palavra
Bíblia, não aparecem nas Escrituras. Isso, no entanto, não é motivo para
negarmos a existência de um “lugar de purgação”, o qual de fato é
mencionado na Bíblia.
Há várias passagens que nos indicam a
existência desse tal lugar de purificação, mas vamos dar uma olhada em 1
Coríntios 3:12-15, que ao contrário de outras referências bíblicas
sobre o purgatório, não pode ser refutada por protestantes evangélicos.
Vamos analisar um trecho da versão O Livro, uma popular tradução da
Bíblia protestante.
12 E, se alguém sobre este fundamento levanta
um edifício de ouro, prata, pedras preciosas, madeira, feno, palha, 13 a
obra de cada um se manifestará; pois aquele dia a demonstrará, porque
será revelada no fogo, e o fogo testará qual seja a obra de cada um. 14
Se permanecer a obra que alguém sobre ela edificou, esse receberá
*galardão. ( s.m. *Recompensa ou prêmio por serviços valiosos prestados.
Honra, glória) 15 Se a obra de alguém se queimar, ele sofrerá prejuízo;
mas o tal será salvo todavia como que pelo fogo.
Quando lemos
essa passagem no contexto do capítulo 3, vamos notar que São Paulo se
dirige a uma porção da Igreja de Cristo. Ele repreende os fiéis
coríntios sobre suas ações pecaminosas, tais como divisões e ciúme, etc.
No capítulo 3, São Paulo não só afirma que nossas obras são
recompensadas, mas ele também lida com a qualidade das obras do homem,
pelas quais cada um de nós seremos recompensados ou punidos.
O que planta ou o que rega são iguais; cada um receberá a sua recompensa, segundo o seu trabalho. 1 Cor3: 8
Se
analisarmos o versículo 15 do mesmo capítulo, temos um exemplo de uma
pessoa cujas obras já foram julgadas e queimadas, portanto ela “sofrerá
prejuízo”, mas será finalmente salva pelo fogo. A fim de esclarecer o
que isso significa, precisamos definir o que “sofrer prejuízo”
representa. A expressão “sofrer prejuízo” provém de uma forma da palavra
grega Zemio. Lembre-se que o grego é o idioma original dos textos
bíblicos. Outras formas dessa mesma palavra grega também aparecem no
Antigo Testamento com o significado de “castigo” [Exodus 21:21,
Provérbios 17:26 e 19:19, etc ..]. Isso significa que Zemio foi
traduzido em 1 Cor 3:15 como “sofrer prejuízo”, mas também quer dizer
punição ou castigo. Portanto, a passagem 1 Cor3:12-15 nos dá uma
descrição clara do Purgatório, pois é a isso que São Paulo se refere.
São
Paulo faz uma analogia sobre a qualidade dos nossos trabalhos usando
materiais como ouro, prata, pedras preciosas para representar uma adesão
mais perfeita ao Evangelho de Cristo, e madeira, palha e restolho, que
serão queimados e, pelos quais o homem “sofrerá prejuízo” ou “punição”
mas no fim ele, o homem, será salvo, todavia como que pelo fogo.
Assim,
em 1 Coríntios 3:12, a madeira, feno e palha (que são queimados)
significam as obras de um homem que morreu em estado de justificação e
foi perdoado de qualquer pecado mortal que ele possa ter cometido. Ele
é, portanto, salvo, mesmo que não tenha feito reparação por todos seus
pecados cometidos depois do batismo.
O senhor se irritou e mandou
entregar aquele servo aos carrascos, ATÉ QUE PAGASSE toda a sua dívida.
É ASSIM que o meu Pai que está nos céus FARÁ convosco, se cada um não
perdoar de coração ao seu irmão.” Mateus 18: 34-35
Procura
reconciliar-te com teu adversário, enquanto ele caminha contigo para o
tribunal. Senão o adversário te entregará ao juiz, o juiz te entregará
ao oficial de justiça, e tu serás jogado na prisão. Em verdade, te digo:
dali não sairás, enquanto não pagares o último centavo. Mateus 5:25-26
Ou
seja, em ambas passagens vemos uma referência implícita ao lugar de
expiação o qual a Igreja chama Purgatório. Enquanto estamos à caminho do
tribunal, uma alusão ao julgamento individual depois da morte, somos
obrigados a nos reconciliar, pois adversário ( Satanás, o acusador) nos
condenará diante do Juiz (Cristo Nosso Senhor) que por sua vez nos fará
justiça, e seremos jogados na prisão (purgatório), até que nossas
dívidas (cada pecado cometido e não expiado) sejam pagas. Essas
passagens são referências ao purgatório e não ao inferno, como alguns
alegam, pois afirmam que uma vez que as dívidas são pagas, o devedor (
pecador) sairá da prisão. Como sabemos, uma vez condenado, ninguém sai
do inferno. Enquanto as almas do purgatório, uma vez purificadas,
ascendem ao céu.
A Posição da Igreja
Neste contexto se
encaixa perfeitamente a doutrina católica sobre o Purgatório. O Concílio
Católico de Lyon II, definiu Purgatório da seguinte forma:
Papa Gregório X – Concílio de Lyon II, 1274:
“Porque
se eles morrem na caridade verdadeiramente arrependidos antes que eles
tenham feito satisfação através de dignos frutos de penitência pelos
pecados cometidos e omitidos, suas almas são purificadas depois da morte
por punições purgatóriais ou depurantes…” (Denzinger 464)
Um
grande exemplo de um homem que foi perdoado de seus pecados graves, mas
não fez reparação por eles, é encontrado no caso de Davi. Em 2 Samuel 11
(2 Reis 11 na Douay-Rheims Bíblia católica), lemos que o Rei Davi
cometeu adultério com Bate-Seba. David também mandou matar o marido de
Bate-Seba. Estes são os pecados mortais. Se Davi tivesse morrido naquele
estado, ele teria ido para o inferno, pois 1 Coríntios 6:9 nos mostra
que nenhum adúltero ou assassinos entrarão no céu. Mas Davi se
arrependeu do seus pecados, quando condenados por Natã, em 2 Samuel 12.
2
Samuel 12:13 – “E disse Davi a Natã: Pequei contra o Senhor. E disse
Natã a Davi, o Senhor perdoou de teu pecado, não morrerás.
O
Senhor levou o pecado de Davi, e Natã, o disse que não iria morrer.
‘Morrer’ nesse contexto significa que ele não iria morrer eternamente,
ou seja, perecer no inferno. A culpa do pecado foi perdoada porque Davi
se arrependeu verdadeiramente e se transformou a partir dai. Mas isso
significa que tudo foi acertado? Não, pois plena satisfação por seu
pecado mortal não tinham sido feitas. Lemos em 2 Samuel 12:14-15 que
Davi teve de sofrer a perda de seu próprio filho para fazer satisfação
por seu pecado, um pecado que já havia sido perdoado.
2 Samuel
12:14-15 “… Todavia, como desprezaste o Senhor com essa ação, morrerá o
filho que te nasceu. E Natã voltou para sua casa. O Senhor feriu o
menino que a mulher de Urias tinha dado a Davi, e ele adoeceu
gravemente.”
Isto fornece prova inegável de que a culpa de um
pecado de um crente pode ser perdoada sem que a completa punição seja
levada apenas pelo arrependimento. O Concílio de Trento colocou a
questão desta forma:
Papa Júlio III,
Concílio de Trento,
sobre o Sacramento da Penitência, Sess. 14, cap. 8, 25 de novembro de
1551 – “… é absolutamente falsa e contrária à Palavra de Deus que a
culpa [do pecado] nunca é perdoada pelo Senhor, sem que a devida punição
também receba remissão. Pois exemplos claros e ilustres encontram-se
nos Escritos Sagrados [cf. Gênesis 3:16 f; Num. 12:14; Nm 20:11; II Reis
12:13 ss; etc].” (Denzinger 904).
Há várias referências à
existência do purgatório no Antigo Testamento, bem como outras
referências no Novo Testamento, mas, como visto em 1 Coríntios 3:12-15, o
conceito de Purgatório é ensinado nas Escrituras e foi aceito pelos
primeiros cristãos. Mas por que os antigos cristãos acreditam no
purgatório e até oravam para os mortos? Faziam-no, obviamente, porque
não se trata de uma doutrina inventada pelos homens, mas de uma noção
claramente ensinada nas Escrituras, e também porque esse ensinamento
fazia parte da tradição recebida dos Apóstolos.
Por Ellen Cristine Walker – Pertencente ao Apostolado Paraclitus e Criadora do Blog Igreja Militans
www.paraclitus.com.br
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