A Semana Santa, que ora iniciamos, pode ser considerada um manual de
instruções para o cristão. Jesus pediu a seus discípulos que
preparassem, com todo esmero, a sua Páscoa e, com isso, nos ensina hoje a
fazer o mesmo. Vamos ler e meditar juntos o relato dos preparativos da
Páscoa de Jesus?
Assim descreve o evangelista Marcos: “No primeiro dia dos ázimos,
quando se imolava a Páscoa, os seus discípulos lhe disseram: ‘Onde
queres que façamos os preparativos para comeres a Páscoa?’. Enviou então
dois dos seus discípulos e disse-lhes: ‘Ide à cidade. Um homem levando
uma bilha d’água virá ao vosso encontro. Segui-o. Onde ele entrar, dizei
ao dono da casa: ‘O Mestre pergunta: Onde está a minha sala, em que
comerei a Páscoa com meus discípulos?’ E ele vos mostrará, no andar
superior, uma grande sala arrumada com almofadas. Preparai-a ali para
nós”! (Mc 12b-15).
O apóstolo Paulo, por sua vez, lembra aos cristãos da comunidade de
Coríntios para não celebrarem a Páscoa com o fermento da malícia e da
perversidade (cf. 1 Cor 5,8). Não é esta uma orientação segura também
para nós hoje? É triste constatar que muitos cristãos hoje vivem a
Semana Santa com certa frieza e até na indiferença. A Semana Santa para
nós, discípulos de Jesus, não é uma espécie de “carpe diem” (um
aproveitar o hoje). Não é tempo para passear, pescar, se divertir,
curtir a vida, relaxar, espairecer - como se fosse um feriadão. Assim
como os discípulos de Jesus, também nós hoje devemos nos preparar bem
para passar esses dias grandes na sua companhia. O Papa Francisco se
lamenta que “há cristãos que parecem ter escolhido viver uma quaresma
sem Páscoa"(EG 6). Contentam-se em celebrar uma Páscoa de
aparência, sem graça, sem vida e sem passagem da morte para a vida. O
bom cristão deve dizer com os cristãos de Abitine: “sem Eucaristia não
podemos viver”. Parafraseando, “sem Semana Santa não podemos
viver”. Onde, como e com quem vamos celebrar a Semana Santa deste ano de
2014?
Vejamos, então, os ensinamentos e as instruções que a Santa Mãe Igreja nos proporciona na Semana Santa através de sua liturgia:
O Domingo de Ramos é o grande portal de entrada na
Semana Santa, a Semana em que Jesus caminha até ao ponto culminante da
sua existência terrena. Ele sobe a Jerusalém para dar pleno cumprimento
às Escrituras e ser pregado no lenho da cruz, o trono donde reinará para
sempre, atraindo a Si a humanidade de todos os tempos e oferecendo a
todos o dom da salvação.A liturgia deste Domingo inicia-se com a bênção
dos ramos e a procissão que comemora a entrada triunfal de Jesus na
Cidade Santa de Jerusalém, na qual é acolhido como Rei. Na liturgia
Eucarística, o Evangelho proclamado é a narrativa da Paixão do Senhor.
Somos convidados a entrar com Jesus no mistério de sua paixão e aquecer o
nosso coração com o amor que não tem fim, o amor de Deus por nós. O
ensinamento deste dia é que devemos acolher Jesus em nossa vida, nos
deixar atrair pela força do seu amor e trilhar o caminho alto que nos
conduz a Deus.
Na Quinta-Feira Santa inicia-se o Tríduo Pascal com a
solene celebração da Ceia do Senhor. O mistério Pascal é o mistério
central da vida cristã. Unidos a Jesus Cristo na sua Paixão, Morte e
Ressurreição, podemos também nós viver santamente nossa paixão, morte e
ressurreição. Neste dia Jesus instituiu o grande dom da Eucaristia e do
sacerdócio ministerial. Também neste dia Jesus lavou os pés de seus
apóstolos e nos deixou o mandamento do amor, nos ensinando, deste modo, a
unir em nossas vidas, Eucaristia e serviço em favor dos irmãos. Quem se
senta à mesa da Eucaristia não tem o direito de desprezar os pobres e
marginalizados, nos quais Jesus se faz particularmente presente (cf. (Mt
25,31-46).
A Sexta-Feira Santa é um dia inteiramente centrado na
cruz e na morte de Cristo. Não se celebra a Eucaristia neste dia. A
principal celebração deste dia é a celebração da Paixão que, é,
fundamentalmente, uma ampla celebração da Palavra que culmina com a
adoração da cruz e termina com a comunhão eucarística. Não é dia de luto
pela morte de Jesus. É a morte do Ressuscitado que celebramos, motivo
pelo qual falar de luto é inadequado. É também dia de jejum e
abstinência. Somos convidados e contemplar o mistério da morte de Jesus
como mistério de amor infinito por nós. Neste dia “o Verbo emudece,
torna-se silêncio de morte, porque se disse até calar, nada retendo do
que nos devia comunicar. Está sem palavra a Palavra do Pai, que fez toda
criatura que fala; sem vida estão os olhos apagados d’Aquele a cuja
palavra e aceno se move tudo o que tem vida”(Papa Emérito Bento XVI, Verbun Domini, 13).
O Sábado Santo é considerado o dia do silêncio
litúrgico. A Igreja permanece em comunhão com o seu Senhor que repousa
no sepulcro. Por isso, neste dia não se celebra nenhum sacramento. O
grande símbolo deste dia é o Círio Pascal que entra solenemente no
início da Vigília Pascal, simbolizando Cristo, Luz do mundo, que dissipa
as trevas do pecado. Na liturgia da Palavra a Igreja proclama as
maravilhas operadas por Deus na história da salvação, começando pela
criação do mundo e passando pela libertação da escravidão do Egito.
Maravilhas de todas as maravilhas é a Ressurreição de Cristo. Esta é a
noite da nova criação, do novo mundo recriado na luz da ressurreição do
Senhor. Esta Vigília se conclui com o “Aleluia”, canto, por excelência,
da ressurreição, e a Solene liturgia eucarística da Páscoa do Senhor.
Domingo da Páscoa. A Páscoa é a festa da nova criação.
Jesus ressuscitou e nunca mais morre. A porta que dá acesso à nova
vida foi arrebentada. Na Páscoa, ao amanhecer do primeiro dia da semana,
Deus disse novamente: “Faça-se a luz!” Antes tinham vindo a noite
escura do Monte das Oliveiras e da traição de Judas, o eclipse solar da
paixão e morte de Jesus, a noite do sepulcro e do silêncio. Mas, agora a
criação recomeça inteiramente nova. Jesus ressuscita do sepulcro. A
vida é mais forte que a morte. O bem é mais forte que o mal. O amor é
mais forte que o ódio. A verdade é mais forte que a mentira. O salmo
desta liturgia canta: “Este é o dia que o Senhor fez para nós,
alegremo-nos e nele exultemos”. A Ressurreição de Cristo é o mistério
fundante da fé cristã. Já bem dizia Santo Agostinho: “Crer que Jesus
morreu não é grande coisa. Isto até os pagãos professam. Grande coisa é
crer que Jesus ressuscitou. A fé cristã é a ressurreição de Cristo”.
O Ressuscitado vence toda forma de escuridão. Ele é o novo dia de Deus
que dá sentido pleno à nossa vida. Celebremos, portanto, nossa Páscoa na
pureza e na verdade. FELIZ PÁSCOA DE RESSURREIÇÃO!
Dom Pedro Brito Guimarães
Arcebispo de Palmas
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